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Tóquio 2021: a edição desafio

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Disputados desde 1886, os Jogos Olímpicos da era moderna foram adiados pela primeira vez. A competição, realizada em Tóquio, capital do Japão, seria em 2020, mas foi transferida para 2021 por causa da pandemia. A cerimônia de abertura é nesta sexta (23), às 8h da manhã pelo horário de Brasília, no estádio Olimpic de Tóquio. 
 
O Brasil já estreou nesta quarta (21), às 5h da manhã pelo horário de Brasília. A seleção feminina de futebol jogou contra a China e venceu por 5 a 0. A delegação brasileira está em Tóquio com mais de 300 atletas e pelo menos oito brasileiros têm chances de conquistar medalha olímpica. Dentre eles, os surfistas Gabriel Medina e Ítalo Ferreira, os atletas do vôlei masculino e a skatista Pâmela Rosa. 
 
Para o professor da Escola de Educação Física da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) Heber Eustáquio de Paula — convidado do "Em Discussão" desta semana para abordar os desafios desta Olimpíada —,  mesmo diante de dificuldades e incertezas, os atletas devem estar com os "corações repletos de satisfação". "A preparação para esses jogos foi muito difícil. Treinos em casa, poucas oportunidades de intercâmbio e competições internacionais, clubes fechados, adoecimento por Covid-19. Todos esses aspectos foram e são dificuldades reais que os competidores têm enfrentado".
 
Apesar da pandemia, Tóquio quer ser lembrada como sede de uma das Olimpíadas mais ecológicas da história. O slogan do evento, "Be Better, Together", sugere que é preciso desenvolver uma consciência ambiental. A meta da organização é reciclar 65% dos resíduos gerados e promover o reuso de 99% dos materiais utilizados nos jogos. Além disso, as medalhas produzidas são com material reciclado e o pódio de resíduos plásticos a partir de impressão 3D. 
 
Mesmo com o aumento do número de casos de Covid-19 no Japão, as Olimpíadas foram mantidas. Professor, o que você achou da decisão, visto que mais de 10 mil atletas de 205 países estão participando?
 
Primeiro, é preciso entender o porte e a complexidade de um evento esportivo como os Jogos Olímpicos. Trata-se do maior evento esportivo do planeta, 15 mil atletas, voluntários, árbitros, imprensa etc. Todos os números são muito grandes. Pessoalmente, creio que tal decisão foi temerária, já que, até o momento, os eventos esportivos realizados envolveram situações menos complexas e com um número bem menor de participantes, como a NBA e eventos por modalidades que ocorrem em um só local. No caso dos Jogos Olímpicos, as arenas são muitas, em vários locais, e há a necessidade de muitos deslocamentos ao mesmo tempo no espaço. Além disso, os índices de imunização da população japonesa até o momento são baixos e há um sentimento de rejeição à realização do evento, inclusive com protestos. Além da baixa imunização, os baixos índices de letalidade foram possíveis pelo isolamento das ilhas e medidas de distanciamento e bloqueios a estrangeiros. Estamos a poucos dias do evento e há muitas incertezas quanto aos riscos e controles. 
 
O Japão teve oito anos para se preparar para a Olimpíada, mas foi surpreendido com a pandemia no ano passado. Como você avalia a organização dos Jogos Olímpicos? Como estão as adaptações para o evento acontecer?
 
Acho que, nesse caso, oito anos de preparação não dão conta de conter todas as ameaças e a complexidade da realização desses Jogos. As providências e procedimentos de ordem sanitária são muito bem cuidados, mas o fator imprevisibilidade se destaca neste cenário. Não tem como testar um evento desse porte antes da sua realização. Por isso, creio que as adaptações dificilmente vão oferecer as garantias que são minimamente desejáveis nesse caso e que foram possíveis em eventos menores. Não há nem mesmo como garantir que os atletas que irão competir estejam imunizados. 
 
De que forma você acredita que a pandemia pode impactar na competição ou no alcance da Olimpíada? Sabe de mudanças nas regras para atender aos protocolos de segurança?
 
Na competição, com certeza, há impactos. Uma boa parte, a meu juízo, negativa do ponto de vista sociocultural e esportivo. Eu explico: nas modalidades individuais, por exemplo, cujos circuitos estão sendo retomados em bolhas, muitos atletas têm preferido não participar dos Jogos Olímpicos para não comprometer suas temporadas. Isso significa que em muitas modalidades não estarão presentes os melhores atletas. Outro aspecto é a mensagem de que "os Jogos Olímpicos não podem parar" enquanto muitas realidades cotidianas das pessoas estão totalmente alteradas ou mesmo paralisadas. Neste caso, as questões políticas também são importantes. As regras esportivas em geral estão mantidas. O que muda são os protocolos de distanciamento. Por exemplo, os cumprimentos, trocas de flâmulas, contatos físicos não propriamente da disputa esportiva, uso de máscaras quando em deslocamento ou contato com médicos ou fisioterapeutas. Em geral, as regras da disputa esportiva estão mantidas. 
 
As Olimpíadas só foram canceladas três vezes, por causas das duas Guerras Mundiais, e esta foi a primeira vez que ela foi adiada por um ano. Você acha que o adiamento da competição pode ter prejudicado os atletas de alguma forma?
 
Com toda certeza, nesses Jogos Olímpicos não teremos os atletas em suas melhores condições. Para a maioria dos atletas, a participação em Jogos Olímpicos significa algo muito especial, em alguns casos, o auge de suas carreiras, como por exemplo no atletismo. Uma medalha olímpica no atletismo se sobrepõe a todas as outras conquistas. Com o adiamento dos jogos, os planejamentos e periodizações dos treinamento e o pico de performance para o momento das competições olímpicas ficam quase inviáveis. Além disso, para um bom número de modalidades há competições que são mais importantes. É o caso do basquete, que em termos esportivos tem na NBA a sua maior expressão.
 
Cinco modalidades vão participar pela primeira vez da competição: beisebol/softbol, karatê, escalada, surfe e skate. Você acredita que a delegação do Brasil tem maior chance em alguma(s) delas? Nas modalidades tradicionais, você percebe algum favoritismo dos brasileiros?
 
Na maioria dessas modalidades a chance de o Brasil figurar como destaque é bastante remota. No caso do skate, temos, além de uma boa equipe, a atual campeã mundial, o que dá muita esperança para uma boa colocação ou mesmo medalhas. No surfe, o nosso país já possui muitos títulos e teremos entre os nossos representantes o Gabriel Medina, o que nos dá muita chance. No karatê e escalada não temos atletas classificados para os Jogos.
 
O Brasil tem mais de 300 atletas classificados para as Olimpíadas. Como você avalia essa participação do Brasil? Acredita que os competidores estão motivados? As condições de preparação disponibilizadas são bem avaliadas?
 
O nosso país tem sido representado numericamente nos Jogos com uma visibilidade. Já temos modalidades bem estabelecidas, com delegações crescentes em termos numéricos e em alguns casos com uma excelente performance. Isso é importante para a exposição nos meios de comunicação, o que faz com que novas gerações se aproximem da prática de esportes diversificados. Carecemos ainda, no Brasil, de políticas que permitam trajetórias de permanência do foco nos treinamentos e competições, sem prejudicar outras oportunidades de vida. Leis de incentivo, bolsas, financiamentos, reconhecimento social e perspectivas de futuro para além do período de competições são fundamentais para que as pessoas, sobretudo os jovens, possam se dedicar ao esporte sem perdas na escolarização e na formação profissional. Quanto à motivação, não tenho dúvidas. Aqueles que chegarem a esse evento, mesmo diante de tantas dificuldades e incertezas, estarão com os corações repletos de satisfação existencial. A preparação para esses Jogos foi muito difícil. Treinos em casa, poucas oportunidades de intercâmbio e competições internacionais, clubes fechados, restrição a viagens, adoecimento por Covid-19, impedimentos, quarentena, bolhas… Todos esses aspectos foram e são dificuldades reais que os competidores têm enfrentado.
 
A falta de torcedores nos estádios pode influenciar nos resultados dos jogos?
 
Esse fator também será importante, inclusive para os aspectos psicológicos que fazem parte do esporte. A presença de público afeta diretamente o comportamento dos competidores. O esporte em geral e nos Jogos Olímpicos certamente implica uma relação entre atletas e público. Arenas com 50% de lotação ou vazias influenciam diferentemente os atletas em suas motivações e performances. As últimas notícias dos Jogos Olímpicos no Japão não são de todo animadoras. Veto à presença de público, aumento de casos de Covid-19, maior controle em relação aos atletas, proibição de turistas, estado de emergência, rumores de cancelamento, frustração das expectativas econômicas. Nesse contexto está claro que teremos uma edição dos Jogos Olímpicos diferente de tudo que já vimos. 
 
Acredita que esta Olimpíada deixará algum ensinamento para a próxima edição, Paris 2024, e para as seguintes?
 
Será um grande aprendizado. A questão sanitária mundial e sua relação com grandes eventos parece ser definitiva a partir de Tóquio 2020. Lembremos que esses Jogos são a edição adiada dos Jogos previstos para 2020. E, mesmo assim, depois de mais de um ano de adiamento e somados perto de uma década de candidatura e preparação, ainda temos muitas incertezas. O aprendizado do esporte em bolhas é uma realidade e com experiências de sucesso. No caso dos Jogos Olímpicos, essa experiência está sendo construída nessa edição em Tóquio com olhares atentos do mundo inteiro. Paris 2024 certamente vai se beneficiar disso. 
 
EM DISCUSSÃO - Esta seção é ocupada por uma entrevista, no formato pingue-pongue, realizada com um integrante da comunidade ufopiana. O espaço tem a função de divulgar as temáticas em pauta no universo acadêmico e trazer o ponto de vista de especialistas sobre assuntos relevantes para a sociedade. Confira todas entrevistas já publicadas. 
 
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