Agliene Melquíades

Criado por Agliene Melquíades em ter, 29/11/2016 - 10:12 | Editado por Lígia Souza há 8 anos.
“Mas você estava sozinha na rua?”; “Voltando de alguma festa?”; “Você ‘tava’ de saia?”; “Você era virgem?”. Essas foram algumas das indagações dirigidas a Laura Muller Sagrilo, sobrevivente de um crime de estupro. Em roda de conversa no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA), na última quarta-feira (24), como parte da programação da I Semana da Diversidade de Ouro Preto e Mariana, a estudante do curso de Serviço Social falou sobre o estupro pela perspectiva da vítima.
Às 19h de 14 de outubro de 2002, Laura esperava o ônibus rumo ao cursinho em que estudava, em Santa Maria, município do Rio Grande do Sul. De repente, um homem que estava sentado próximo a estudante, com 15 anos na época, a segura pelo braço e aponta uma faca para a barriga da adolescente. “Ele foi me direcionando pela rua. Eu ofereci dinheiro, o celular, e ele apenas disse: ‘não quero nada de você’. Nesse momento, eu sabia o que ele queria e pretendia fazer, e eu só pensava em ficar viva”, conta. Leia o relato de Laura na íntegra em sua página.
LUTO - “No momento eu lutei pra ficar viva. Mas, depois, queria morrer; a dor era na alma”. Laura foi culpabilizada por alguns amigos e familiares por estar usando saia no dia do crime. A estudante ficou um mês na cadeira de rodas, sentindo dor, fraqueza, insônia. Repetiu o ano escolar por duas vezes. Não tinha vontade de estudar nem de cuidar de si. Desenvolveu síndrome do pânico, depressão, e tentou suicídio.
Às 19h de 14 de outubro de 2002, Laura esperava o ônibus rumo ao cursinho em que estudava, em Santa Maria, município do Rio Grande do Sul. De repente, um homem que estava sentado próximo a estudante, com 15 anos na época, a segura pelo braço e aponta uma faca para a barriga da adolescente. “Ele foi me direcionando pela rua. Eu ofereci dinheiro, o celular, e ele apenas disse: ‘não quero nada de você’. Nesse momento, eu sabia o que ele queria e pretendia fazer, e eu só pensava em ficar viva”, conta. Leia o relato de Laura na íntegra em sua página.
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Felipe Cunha

Com a página "Projeto Fênix", Laura abre um espaço para outras mulheres compartilharem suas histórias.
Foram anos para que Laura conseguisse falar sobre o trauma. Em 2002, ela conseguiu voltar ao local. “Superei com ajuda de amigos e amigas e de minha família (mãe e irmã), recebi apoio de muitas pessoas. Nunca me calei, nunca escondi. Superei, mas jamais esqueci”.
LUTA - Para Laura, o trauma é uma montanha russa com picos de alegria e de tempestade. Ela afirma que quando as pessoas ignoram o estupro, na tentativa de fazer com que o trauma passe mais rápido, machuca ainda mais a vítima. “Eu não fui a última. Quando ignoram, é como se fôssemos as culpadas.” Ela conta também que o desabafo das pessoas que sofreram violência sexual pode acontecer subitamente, em qualquer lugar. Nesses casos, é importante que a pessoa com quem o desabafo foi compartilhado dê atenção e converse com a vítima. É extremamente importante a escuta e o acolhimento às sobreviventes dessa violência.
Quando Laura recomeçou a vida sexual, foi reprimida. Segundo ela, há todo um tabu em relação à vida sexual de vítimas de estupro. O fato de ela retomar a vida sexual, foi para muitos como se a violência sofrida “não fosse tão grave”. Ela passou pela fase da negação, quando acreditou que não merecia ou não iria sentir prazer.
“Quando falamos que todo homem é um estuprador em potencial, estamos dizendo que nunca sabemos quem são eles. Não está escrito na testa. É uma forma de segurança pensar assim. Atualmente ouvimos muito a frase 'ah, você vê machismo em tudo'. Mas ele está em tudo. Cansamos de ficar caladas. Enquanto houver mulher agredida e violentada, eu vou continuar lutando”.
Em 2013, Laura criou o Projeto Fênix, uma página no Facebook onde recebe relatos de vítimas de violências sexuais e obstétricas. Ela também é doula e educadora perinatal, facilitadora em grupos de coletivos feministas e em cursos de formação de doulas. Além de ser autora do Projeto Fênix Para Vítimas de Violências Sexuais e Obstétricas, atua como voluntária e coordenadora do grupo Gestar Ouro Preto-MG e é colunista no site Imprensa Feminista.