Duas dissertações do Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos da Linguagem (Posletras) da UFOP foram reconhecidas em uma recente premiação interna, organizada pelo próprio colegiado do curso, com foco em pesquisas defendidas entre 2021 e 2024. O trabalho de Monick Pereira de Araújo dos Santos, orientado pelo professor Bernardo Nascimento Amorim, conquistou o prêmio principal e o de Ana Luiza Barreto Lisboa, orientado pela professora Soelis Prado, recebeu menção honrosa.
Intitulada "Um sujeito guenzo: a composição da voz poética a partir da memória da infância, em A escola das facas, de João Cabral de Melo Neto", a pesquisa de Monick analisa como o poeta reelabora experiências da infância em sua obra, especialmente na fase considerada mais memorialística e subjetiva de sua produção. Segundo a autora, a investigação evidencia que a linguagem cabralina se transforma justamente quando essa voz poética infantil, o chamado "sujeito guenzo", emerge de forma mais intensa, projetando ecos da biografia do autor em sua escrita.
Ainda de acordo com a pesquisadora, o intuito desse estudo não foi interpretar o sujeito lírico como uma voz fidedigna do empírico, porém fez-se necessário produzir assimilações entre o poeta e sua composição, relacionando-a com sua biografia, mas sob a perspectiva de uma composição de transformação.
Já a dissertação de Ana Luiza propõe uma reflexão sobre a preservação da memória por meio do léxico, ao analisar expressões populares coletadas junto a guias turísticos de Ouro Preto. No trabalho, foram identificados 17 fraseologismos (nome técnico dado aos ditados populares), muitos deles associados a episódios históricos da cidade, como o famoso "conto do vigário", cuja origem estaria ligada à rivalidade entre as paróquias do Pilar e da Conceição.
A ideia da pesquisa nasceu a partir de uma experiência pessoal da orientadora, que, ao ouvir um guia turístico narrar ditados locais, sugeriu o tema à aluna. Soelis explica que, por já ser de Ouro Preto, a orientanda abraçou imediatamente a proposta e construiu a dissertação a partir dessa relação viva com a cidade e com a linguagem de seu povo.
Para Ana Luiza, o reconhecimento ultrapassa o âmbito individual. "A menção honrosa vai para o povo ouro-pretano, não só para mim. Eu me considero apenas uma mediadora. O que eu pude escrever e publicar foi sobre a riqueza que já existe aqui. Esse reconhecimento é uma forma de sustentar a ideia de que a nossa linguagem tem muita relevância cultural e identitária e merece mais estudos", enfatiza.
Além de valorizar a oralidade dos guias de turismo, profissão marcada pela transmissão de saberes entre gerações, Ana Luiza ressalta também a importância de considerar a língua como patrimônio imaterial da cidade. Na visão da autora, "Ouro Preto é reconhecida mundialmente por seu patrimônio material, mas também precisa ser reconhecida pelo povo que aqui mora e pelas histórias que circulam em sua linguagem".