Criado por Administrator em qua, 19/02/2014 - 15:48
Refletir sobre a condição social dos portadores de transtornos mentais, ou loucos, é um desafio desde que se iniciou a reforma psiquiátrica no Brasil, na década de 1970. Nesse processo, os assistentes sociais têm papel importante na reinserção dos indivíduos na sociedade. Professora do curso de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto, Cristiane Tomaz desenvolve pesquisas que buscam compreender a relação da loucura com a sociedade, além de analisar como a luta antimanicomial e as políticas públicas de saúde mental podem oferecer condições mais humanas para pacientes que, historicamente, foram excluídos do convívio social.
Cristiane orienta pesquisas de iniciação científica que buscam compreender como a política de saúde mental está constituída em Mariana e Ouro Preto, ao mesmo tempo em que investiga se os serviços são oferecidos de acordo com o que a legislação prevê. Esse trabalho visa também a identificar quais as dificuldades existentes nesse processo.
HISTÓRICO - O movimento da reforma psiquiátrica surge da reforma sanitária que, inicialmente, não contemplava a extinção dos manicômios. Posteriormente, influenciados pelas ideias do psiquiatra italiano Franco Basaglia, as políticas públicas no Brasil passam a refletir não só sobre a saída dos considerados loucos da internação, mas também em oferecer condições materiais e psicológicas para os indivíduos que retornam ao convívio social.
"O eixo principal da reforma psiquiátrica é o resgate da cidadania do louco, que é algo que ele perde com a internação,” esclarece Cristiane. “A reforma luta para que liberdade e assistência estejam juntas,” completa. Dessa forma, os métodos de tratamento para a loucura sofreram grandes transformações ao longo do último século. No Brasil, um marco foi a aprovação da Lei 10.216 de 2001, conhecida como a lei da reforma psiquiátrica. Além disso, a criação do programa “De Volta pra Casa”, instalado durante o Governo Lula, representou um passo importante na reforma, no sentido de oferecer suporte financeiro e servir de estímulo para as famílias. Essas ações buscam colocar em prática as políticas públicas de saúde mental, por meio de ações como a redução de leitos hospitalares, a criação de residências terapêuticas e a expansão dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Para Cristiane, “o governo precisa estar preparado para oferecer uma rede de serviços que dê conta da complexidade da saúde mental”.
A respeito do tratamento dos portadores de transtorno mental, Cristiane explica que esse deve ser feito por uma equipe múltipla. “O tratamento para a loucura não é exclusivamente médico. Outros profissionais, como o assistente social, também tratam o doente a partir do seu trabalho, o que contribui na recuperação do sujeito”. A atuação do assistente social consiste em viabilizar o retorno do sujeito para a família por meio de um trabalho socioeducativo com os familiares e a comunidade. Já nos serviços substitutivos ao manicômio, o trabalho do assistente social tem como finalidade a viabilização dos direitos sociais, políticos e civis, com a criação de projetos que possam contribuir para o resgate e o exercício da sua cidadania e sua emancipação social.
Mas, o que é a loucura?
Para Cristiane, chamar os portadores de transtorno mental de loucos não é pejorativo. Ao refletir sobre a condição, ela questiona: “Será que podemos chamar de loucos todos aqueles que têm comportamento inadequado?”.
A curiosidade sobre a loucura e suas manifestações é grande e se traduz em diferentes níveis, seja a partir de um quadro de depressão, seja em casos mais extremos. Cristiane atribui esse posicionamento ao isolamento a que os loucos foram submetidos durante décadas. “As pessoas não sabem lidar com algo que elas não conhecem”, afirma. A professora também critica a chamada “indústria da loucura”, que consistia em manter os doentes internados durante décadas nos hospitais psiquiátricos administrados por setores privados.
“Sobre a efetividade das políticas públicas, Cristiane alerta que “ainda há muito que melhorar, há necessidade de maiores investimentos em políticas públicas articuladas à política de saúde mental, como, por exemplo, a política de assistência social, saúde, habitação”. No entanto, a respeito da cultura em torno da saúde mental, a professora acredita que a forma como a sociedade vê e convive hoje com a loucura vem mudando bastante: “Já há uma aceitação social maior, mas ainda há certa intolerância que tem de ser transformada”, finaliza.



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