Com o tema "Metamorfoses da extrema direita no Brasil: da guerra cultural ao terrorismo doméstico", a aula inaugural do Programa de Pós-Graduação em Letras – Estudos da Linguagem (Posletras), da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), foi ministrada pelo pesquisador João Cezar de Castro Rocha. Professor de Literatura Comparada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), o convidado é especialista em Machado de Assis e atualmente se dedica à análise das estratégias discursivas da extrema direita brasileira.
O evento, realizado no Auditório Francisco Iglesias, no Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS), marcou o início do ano letivo do programa e reuniu estudantes e docentes em uma reflexão profunda sobre linguagem, política e cultura no Brasil contemporâneo. A mediação do encontro foi feita pela coordenadora do Posletras, professora Mônica Gama.
Durante a aula, o professor destacou dois pontos fundamentais para a análise literária no contexto político atual: a abordagem discursiva e a imaginação crítica. Ao defender uma leitura etnográfica dos discursos, João Cezar propôs entender a linguagem como uma ferramenta que molda percepções de mundo e constrói realidades. Segundo ele, a extrema direita tem se mostrado eficiente na construção de narrativas pautadas pelo ódio, especialmente nas redes sociais, utilizando estratégias retóricas direcionadas a provocar afetos negativos em públicos específicos. "A extrema direita é absolutamente hábil no uso de procedimentos retóricos, ou seja, em direcionar um discurso consciente para a produção de um determinado afeto, que é o ódio, direcionado a um determinado público, que é o das redes sociais", afirmou o professor.
João Cezar também apresentou o que chamou de "tripé para compreender o bolsonarismo como mentalidade". O primeiro ponto é o culto à morte presente na Lei de Segurança Nacional de 1969, que esteve em vigor durante a formação militar de Jair Bolsonaro e repete a palavra "morte" 32 vezes. O segundo é a lógica de guerra, que elimina o conceito de adversário político e institui o inimigo como figura central. Por fim, há o papel da linguagem, especialmente a partir das ideias de Olavo de Carvalho, que institucionalizou a retórica do ódio e a lógica de refutação, tornando o diálogo inviável. "Não é que essas pessoas não tenham informações, é que elas têm muitas informações falsas". Ele ainda acrescentou que a extrema direita tem nas redes sociais um projeto deliberado de um ecossistema de desinformação que opera 24 horas.
A coordenadora do Posletras ressaltou a importância de refletir sobre a guerra cultural e os discursos que moldam a sociedade. "A universidade é um espaço privilegiado para desenvolvermos propostas de estudo e pesquisa que nos ajudem a compreender e nos posicionar diante da realidade", afirmou Mônica Gama.
O Posletras conta atualmente com três linhas de pesquisa: Literatura, memória e cultura; Estudos linguísticos, estudos da tradução e patrimônio cultural; e Linguagem, prática social e processo educativo.